sábado, 21 de março de 2009

*Dos antigos inesquecíveis I*

* Para aqueles que deixam partir quem deve ficar*
- Sim...aceito.
Foi a última coisa que ela conseguiu ouvir antes da primeira lágrima cair e encontrar seus lábios. Sentada no último banco da igreja, ela tinha uma visão panorâmica da felicidade indo embora. Por entre as cabeças em sua frente e os arranjos de lírios que ladeavam o corredor principal, ela o avistava. Trajava um terno escuro, cabelos metodicamente penteados, barba feita...na mão esquerda, agora, uma amarra reluzente. Ria como um anjo.
Ao seu lado, olhos vidrados, a mulher vestia branco. O tão tradicional branco de todos os sonhos. O dourado dos cachos brincava em seus ombros nus e as pérolas no pescoço davam-lhe um ar clássico. Noiva de filme. Estava tão irritantemente linda que a fez nausear.
Os dois completavam a moldura do resto da capela. Fazendo os votos, ali, um diante do outro, amando-se, respeitando-se...parecia tão surreal quanto a coragem dela em ir a este casamento. "Não vou suportar". A cabeça balançava de um lado para o outro...o ar mais rarefeito agora..."Como as coisas chegaram a este ponto?" Procurou na mente vaga o momento em que tudo desandou. Não sabia. Teve vontade de gritar, tomar-lhe a mão e os dois correriam igreja a fora, até fugir dos olhares curiosos...ele teria de aprender a amá-la outra vez...
Não pôde. A forma como ele segurava a mão da outra e encarava-lhe a face, despiam-na de qualquer desejo de interromper. Tentou lembrar se alguma vez ele a olhara daquele jeito...o ar não chegou nos pulmões.
Perdera.
Tantos anos e ela só se deu conta que o perdera quando ele se entregou a outra."Burra!" O pensamento latejou.
Baixou a cabeça e viu que as lágrimas que escorriam do rosto, molhavam o vestido cor de uva. Ele adorava o contraste do roxo com sua pele branca, lembrou-se saudosa. Ele adorava como ela passava insegurança em cima de um salto alto ou como ela sorria, desleixada, de suas piadas bobas. Ele adorava tanta coisa nela e nunca escondeu. Ela, por sua vez, sempre teve medo. Sempre esteve ocupada, sempre esteve estressada, sempre "nunca esteve".
Odiou-se por dois segundos quaisquer.
Quando levantou os olhos, viu que ele beijava a noiva. Olhos fechados, mãos firmes em seu rosto. Estava selado.
- Marido e mulher! - escutou vagamente. Ou fora seu subconsciente tentando, a todo custo, acostumar-se com a idéia? Não sabia ao certo.
Apanhou a bolsa deixada ao lado no banco e, antes que pudesse ser vista, saiu da igreja. Da escadaria olhou para dentro e guardou a cena. O homem que acabara de casar era aquele a quem ela teria entregue todos os dias que ainda viriam e, naquele momento, pelo menos naquele momento, ela tinha o direito de ser infeliz.
A lua estava cheia e iluminava uma noite escura e sem estrelas. Descalçou as sandálias e desceu lentamente cada degrau. Ar, ela precisava de ar agora.
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Mal virou-se para a porta e uma silhueta o chamou a atenção. " Você fica linda de roxo, adoro o contraste da cor com sua pele..." - a frase latejou em suas lembranças como um lapso. Tentou apurar a vista. Viu quando a pessoa tirou as sandálias e sumiu na escuridão da noite.
- Não, ela jamais viria... - pensou baixinho embora seu coração sentisse o contrário.
O corredor ladeado de lírios parecia maior agora.

Ps.: Porque ter medo de amar é ter medo de viver pra sempre. O amor é divino.
Ps².: Eu prometo te fazer se apaixonar por mim todas as horas de todos os dias de uma vida inteira de FELICIDADE. Te amo. E eu não tenho mais medo disso.

quarta-feira, 18 de março de 2009

*Do verão passado*

*Dos selos*
Escreveram seus nomes na árvore mais frondosa do quintal. E pintaram um coração.
Alguém dissera que árvores simbolizam o ciclo da vida. "Porque não o ciclo do amor, então?" Ele queria mesmo era dar um presente a ela. Pareceu-lhe romântico, embora não entendesse bem dessas coisas. "É coisa de mulherzinha!"
Mas ela gostara. E se era pra fazer-lhe sorrir, ele era bem capaz de rabiscar em todos os galhos daquela mata!
Ali permaneceram horas, deitados na grama, mãos dadas, olhares congelados no céu. O sol estava envergonhado naquele dia. A brisa da manhã dançava nos cabelos dela. Tentou se apegar a qualquer imagem que pudesse levar consigo. O jeito como ela enrolava a pontinha dos cachos no dedo, aquele olhar meigo, o formato da sua boca, as piscadelas compassadas...ela parecia um anjo.
Ele já ouvira falar em anjos. Na Igreja, aos domingos. A avó o obrigava a acordar às 5 da matina e "marchar rumo a salvação", ao som das badaladas do sino.
Sentiu a culpa tomar conta de si quando os olhos, incontidos, fitaram os seios dela sob a blusa. "Ah, como ela é linda!" O pensamento voou.
De repente, tomado por uma coragem, que nem sabe de onde veio, encostou os lábios em seu rosto. Ela o olhou. Tão terna e acolhedora como a primeira chuva do caju. Seus olhos eram de um castanho cravejado de pontos dourados.
Sentiu o coração parar quando ela tocou-lhe a face. Uma mãozinha pequena, delicada...
O ar ficou pesado, difícil de respirar.
As pulsações cessaram quando os lábios se tocaram. Quentes, contrastando com o vento úmido da manhã. Foi um beijo rápido, calado...doce. "Ela tem gosto de amora madura!" Ele riu.
- Promete que não vai esquecer de mim?
Ela pareceu surpresa com a pergunta. Apenas sorriu e foi suficiente para que ele entendesse de finais felizes.
Agora ele já era um homenzinho.

Ps.: Porque eu sempre soube que eras tu o que eu quis pra mim, a vida toda.

domingo, 8 de março de 2009

"Das mudanças iguais..."

*Mesmo que mude*
Ela vai mudar.
Bem certo que ele também.
Haverá o dia em que, não mais que de repente, ela vai decidir dormir do outro lado da cama. Ele, talvez, pense que dormir de rede lhe convém.
Ela vai deixar de pintar os lábios. Ele, de se importar com os cabelos.
Ela já não cantará mais no chuveiro. Ele trocará o futebol aos domingos pelas "palavras cruzadas".
Ela vai escolher um jeito novo de dizer "amor". Ele não lhe trará mais rosas vermelhas...talvez lhe traga um vaso, ou pães quentinhos da padaria ao lado. Não por desmazelo, mas pela rotina que torna os presentes funcionais. Ela pregará o botão daquela camisa que ele pedira há tanto tempo. A camisa não o veste mais, ainda assim, ele parecerá satisfeito pela lembrança.
Os dias correrão...lentos, vagarosos...
Então haverá uma tarde. Não uma manhã, pois pela manhã cada qual tem seus "afazeres domésticos". Não uma noite, pois eles dormem cedo.
Uma tarde.
Em que sentados na varanda, cada qual em sua cadeira de balanço, ele sentirá uma vontade enorme de tocar-lhe a mão. E o fará. E qual será seu espanto quando olhá-la nos olhos e enxergar a alma de menina com quem se casara. Os lábios já não tem mais aquele fervor e o carmim de antigamente, mas ainda lhe parecerão sensuais.
Ele também não está nada mal, ela pensa consigo. Os cabelos, embora ralos, ainda lhe dão todo aquele requinte.
E, por um instante, eles recordarão que a vida não podia ter sido de outra forma. Vão lembrar daquele baile com carinho, daquela música, daquela noite.
Ele vai beijar-lhe a mão do mesmo jeito de antes e ela piscará devagar. Uma, duas, três vezes...os olhos ainda sabem dizer "eu te amo".
E eles dirão um ao outro, em silêncio.
Tudo faz sentido agora.

PS.: "É sempre amor mesmo que mude..."
PS².: Deixa eu ficar velhinha do teu lado?